Vamos refletir mais sobre uma delas, segundo a qual uma foto seria um “fragmento de tempo”, ou seja, o recorte de um instante no fluxo da experiência, o momento preciso de inscrição da luz no “click”. Toda obra tem um tempo de produção, ao qual se somam os diversos tempos de sua fruição – todas as artes visuais podem ser pensadas a partir de suas dimensões temporais. Enquanto algumas obras lidam com um tempo instantâneo, outras lidam com um tempo dilatado. Quando são produzidas, algumas obras isolam, outras sintetizam e outras combinam momentos; na fruição, podem envolver o espectador em diferentes tipos de duração.
No bloco Movimento, os trabalhos de Gustave Le Gray, Gaetano Pescee Robert Smithson e, no bloco Leveza, os trabalhos de Claude Monet, René Clair e Mira Schendel colocam a questão, cada um a seu modo.
Analise as diferentes relações desses trabalhos com o tempo e os sentidos que eles lhe atribuem.
Tempo e Olhar, duas palavras que estão intimamente relacionadas quando o assunto é Artes Visuais. O olhar do artista diante dos fatos do seu tempo o influenciam completamente na criação de sua obra. A história da arte, ao longo dos anos, é cheia de exemplos que fortalecem ainda mais esta conexão, como quando os pré-impresionistas resolveram dar o primeiro passo rompendo com os conceitos das artes clássicas e com as escolas acadêmicas, dando início ao processo da era da Arte Moderna.
A própria evolução da arte - e cabe aqui uma ressalva de que evolução não no sentido de ficar melhor, mas no âmbito das diversificações que a arte sofreu pela passagem do tempo - só foi possível porque o ser humano sempre foi um ‘insatisfeito’, ou seja, ele sempre queria ir adiante do que já foi feito, buscar algo diferente, mudar.
O texto O tempo e os tempos na fotografia mostra esta busca incessante de forma muito clara. Desde Daguerre, passando por Eastman e Bresson até Sebastião Salgado, todos eles contribuíram para que a fotografia tivesse o papel que tem nos dias atuais nas artes visuais. A vontade de cada um destes fotógrafos, de descobrir novos meios de registrar imagens que pudessem ultrapassar os limites do tempo, deu à fotografia e à arte em geral novos sentidos, transformando completamente a relação do artista com a sua obra e com quem a observa.
O processo da fotografia está diretamente relacionado com o processo das artes em geral, uma transformou a outra mutuamente. Elas se impulsionaram, transformando o tempo ao seu redor. Quando Le Gray, em 1856, fotografou A Onda, o ato de captar os movimentos das águas do mar de forma tão nítida e fiel revolucionou e deu um passo importantíssimo para o cinema.
A fotografia, a Revolução Industrial, o período de guerras foram fatos que propiciaram ainda mais esta transformação dos sentidos relacionados às artes e o rompimento dos artistas com os padrões das artes clássicas. Quando Picasso foi buscar na cultura africana a inspiração para a sua obra As Moças d’Avigon, ele deu um novo sentido às artes e transformou o seu tempo. O mesmo aconteceu com Smithson ao transformar terra, rochas e água em obra de arte.
Schendel foi ainda mais longe, não apenas transformou a arte como modificou o tempo, ao fazer uma obra que tinha uma “data de validade”.
Mondrian rompeu ainda mais os sentidos das artes e sua obra alcançou diversos outros campos, como a moda, a arquitetura e o design de móveis.
Foi Monet e sua obra Impressão, Nascer do Sol que deu nome ao movimento Impressionista, dando mais um passo à revolução que começava a se moldar no campo das pinturas, nos anos de 1872.
René Claire transformou os sentidos ao brincar com a dualidade feminino/masculino no filme Entr’acte. Ao colocar um homem “rude” dançando balé contrapondo com a leveza e feminilidade das bailarinas, ela explorou os gêneros do macho e da fêmea.
No projeto Personne, idealizado por mim, eu busco esta transformação dos sentimentos. Ao homenagear uma pessoa, coloco em forma de arte os meus sentimentos por aquela pessoa, eu imortalizo no tempo o meu carinho por aquela pessoa.
Todos estes artistas modificaram os sentidos das coisas, transformaram o seu tempo. No entanto, acredito que a grande transformação que todos eles fizeram foi a humanização das artes, aproximando a arte do observador e, em alguns momentos, fazendo com que ele também seja parte da arte.
O tempo transformou o olhar do artista que transformou o olhar do observador que transformou o olhar do artista que transformou o tempo.
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Imagens:
- Os Índios do Alto Xingu (Sebastião Salgado)
- A Onda (Gustave le Gray)
- As Moças d’Avigon (Pablo Picasso)
- O Trenzinho (Mira Schendel)
- Composição (Piet Mondrian)
- Impressão, Nascer do Sol (Claude Monet)
- Ever (Chris, The Red)
Red Kisses,
Chris, The Red
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